A VIDA É UMA COISA BELA

Um grande Espírito, La Rochefoucauld, disse numa de suas obras, que se devia tremer diante da vida e diante da morte! Certo, se se deve tremer é por ver sua existência incerta, perturbada, completamente falha; é por ter realizado um trabalho estéril, inútil para si e para outros; é por ter sido um falso amigo, um mau irmão, um conselheiro pernicioso; é por ser mau filho, pai irrefletido, cidadão injusto, desconhecedor de seus deveres, de seu país, das leis que vos regem, da sociedade e da solidariedade.
Quantos amigos vi, espíritos brilhantes, engenhosos, instruídos, muitas vezes faltar ao objetivo profundo da vida! Construíam hipóteses mais ou menos absurdas: aqui a negação; ali, a fé ardente; além, se faziam neófitos de tal ou qual sistema de governo, de filosofia e muitas vezes lançaram, ai de mim! suas belas inteligências num fosso, de onde não podiam mais sair senão abatidas e pisadas para sempre.
A vida com suas asperezas, seus maus gostos e suas incertezas, é entretanto uma coisa bela! Como! saís de um embrião, de um nada e trazer em torno de vós os beijos, os cuidados, o amor, o devotamento, o trabalho e isto não seria nada senão a vida! Como é, então, que para vós, seres fanados, sem força, sem linguagem, gerações inteiras tenham criado os campos, incessantemente explorados, da poupança humana? Poupais saber, filosofia, mecânica, ciências diversas; milhares de cidadãos corajosos gastaram os seus corpos e dispuseram de suas vigílias para vos criar mil elementos diversos de vossa civilização. Desde as primeiras letras até uma definição sábia, encontra-se tudo o que pode guiar e formar o espírito; hoje pode-se ver, porque tudo é luz. A sombra das idades sombrias desapareceu para sempre, e o adulto de dezesseis anos pode contemplar e admirar um nascer do sol e o analisar, pesar o ar e, como o auxílio da química, da física, da mecânica e da astronomia, se permitir mil gozos divinos. Com a pintura, reproduz uma paisagem; com a música, inscreve algumas dessas harmonias que Deus espalha em profusão nas harmonias infinitas! Com a vida, pode-se amar, dar, espalhar muito; por vezes pode-se ser sol e iluminar o seu interior, a sua família, as suas relações, ser útil, cumprir a sua missão. Oh! sim, a vida é uma coisa bela, fremente, cheia de fogo e de expansão, cheia de fraternidade e desses deslumbramentos que jogam os misérias para o último plano.
Ó vós todos, meus caros condiscípulos da rua Richelieu; vós meus fiéis de 14; vós todos que, tantas vezes, interrogastes a existência vos perguntando a palavra final; a vós que beijáveis a cabeça, incertos ante a última hora, diante da palavra Morte, que significa para vós: vazio, separação, desagregação, a vós eu venho dizer: Erguei a cabeça e esperai; não mais fraqueza, não mais terror; porque se os vossos estudos conscienciosos e as religiões de nossos pais não vos deixaram senão desgosto da vida, incerteza e incredulidade, é que, estéril em tudo, a ciência humana mal conduzida só atingia o nada. Vós todos, que amais a humanidade e resumis a esperança futura pelo estudo das ciências sociais, por sua aplicação séria, eu vos digo: Esperai, crede e procurai. Como eu, deixastes passar a verdade; nós a abandonávamos e ela batia à nossa porta, que obstinadamente lhe havíamos fechado. Daqui por diante amareis a vida, amareis a morte, essa grande consoladora; porque querereis, por uma vida exemplar, evitar recomeçar; querereis esperar no sólio da erraticidade todos aqueles que amais, não somente a vossa família, mas a geração inteira que guiastes, para lhes desejar as boas vindas e a emigração para mundos superiores.
Vedes que vivo e todos nós vivemos. A reencarnação, que tanto nos fez rir, é o problema resolvido que tanto procurávamos. Aí está este problema em vossas mãos, cheio de atrativos, de promessas ardentes; vossos pais, vossas esposas, vossos filhos, a multidão de amigos vos querem responder; estão todos reunidos, esses caros desaparecidos aos vossos olhos; falarão ao vosso espírito, à vossa razão; dar-vos-ão verdades e a fé é uma lei bem-amada. Mas, interrogai-os com perseverança. Ah! a morte nos causava medo e nós tremíamos! Entretanto eis-me, eu, Guillaumin, um incrédulo, um incerto, reconduzido à verdade. Milhares de Espíritos se apressam, esperam a vossa decisão; eles gostam da lembrança e da peregrinação pelos cemitérios! É uma baliza esse respeito aos mortos; mas esses mortos estão todos vivos; em vez de urnas funerárias e de epitáfios mais ou menos verdadeiros, eles vos pedem uma troca de idéias, de conselhos, um suave comércio de espírito, essa comunidade de idéias que gera a coragem, a perseverança, a vontade, os atos de dedicação e esse fortificante e consolador pensamento que a vida se retempera na morte e que se pode, de agora em diante, a despeito de La Rochefoucault e outros grandes gênios, nem tremer diante da vida, nem diante da morte. (Espírito de Guillaumin - R. E. 1868).
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 16:29