B A T I S M O

Muitas dúvidas ainda afligem os corações humanos com relação ao batismo de João, ao batismo da Igreja Católica e ao batismo de Jesus. Aliás , diga-se de passagem que até mesmo no meio espírita encontramos confrades ainda enraizados nos dogmas do batismo da igreja católica quando aceitam tornarem-se padrinhos e madrinhas de rebentos em face dos laços consangüíneos e/ou de afinidades existentes. Receosos de esclarecerem o sentimento da doutrina dos espíritos sobre esse aspecto, pelos motivos mais diversos, perdem oportunidades preciosas de sua divulgação, mantendo, assim, a ignorância que se protrai no tempo há séculos e séculos. Por causa disso, nestas poucas e despretensiosas linhas, procuramos discernir o sentido oculto das mensagens dos evangelistas que descreveram a cena do batismo de Jesus, proporcionando o entendimento dos demais batismos.
Vejamos:
Mateus, III: v. 13 a 17: "então Jesus veio da Galiléia ao Jordão ter com João, a fim de ser por este batizado. Mas João obstava a isso, dizendo: "eu é que devo ser batizado por ti e tu vens a mim?" Jesus lhe respondeu: "deixa fazê-lo assim por esta hora; porquanto é necessário que cumpramos a justiça", João consentiu. Uma vez batizado, Jesus logo saiu da água e eis que os céus se abriram e ele viu descer sobre ele o espírito de Deus em forma de uma pomba. Imediatamente uma voz ecoou no céu, dizendo: "este é o meu filho bem amado, em que hei posto todas as minhas complacências."
Os Evangelhos de Marcos, Lucas e João descrevem a mesma cena; porém Marcos e Lucas acrescentam que, logo que Jesus saiu da água , "os céus se abriram " e o "espírito de Deus desceu sobre ele, na forma corporal de uma pomba"; e João, no capítulo I, versículo 29, declara: "eis o Cordeiro de Deus, eis o que tira o pecado do mundo"; no versículo 30: "este é o de quem eu disse: depois de mim vem um homem que me foi preferido, porque era antes que eu fosse; no versículo 31: "eu não o conhecia, mas vim batizar com água, para que ele se manifeste em Israel"; e no versículo 32: "e João deu testemunho dele dizendo: vi o espírito descer do céu como uma pomba e pairar sobre ele".
Essa passagem é marco da maior importância, pois assinala, na verdade, o início da vida pública de Jesus, ou seja, o começo da missão terrena do excelso Mestre.
Após silêncio absoluto por dezoito anos, eis que o último contato que se tem conhecimento de Jesus foi quando ele tinha 12 anos de idade, por ocasião do seu famoso encontro com os doutores do Templo de Jerusalém; retorna o Mestre em plenitude de sabedoria e poder, aparentando um homem de seus 30 anos de idade nas margens do Jordão, onde, a partir daí, durante os três inesquecíveis anos promoveu sua grandiosa pregação pública e exemplificação divina de amor, devotamento, caridade e perdão.
João Batista havia iniciado a pregação do Evangelho, preparando o caminho e seus discípulos para receberem os ensinamentos mais avançados que lhes traria o Cristo de Deus, sempre anunciando: "Depois de mim virá um mais poderoso do que eu e de quem não sou digno de, prostrado aos seus pés, calçar-lhe as alpercatas." A apresentação pública de Jesus foi feita por João Batista, na cerimônia do batismo, às margens do rio Jordão, depois de já o ter anunciado ao povo. João praticava o batismo pela água, como sinal simbólico. Na obra mediúnica do Evangelho de João (4º volume de J.-B. Roustaing, p. 148), a imersão na água foi considerada em todas as épocas como um ato de purificação. Daí vem que João, preparando os caminhos àquele que devia de vir, derramava água sobre a cabeça de seus discípulos, tendo em vista com esse ato levá-los ao arrependimento. Lavando o corpo com a água, João mostrava simbolicamente que assim também deveria ser lavado o espírito, mediante uma "nova vida", isenta de faltas e mediante esforço contínuo em prol de seu aperfeiçoamento moral/espiritual.
No livro Roma e o Evangelho (p. 196), Amigó y Pellicer diz que João batizava os homens na água, e Jesus no espírito. E o batismo de Jesus é a vida do espírito, porque seu batismo é a palavra, e as palavras de Jesus são espírito e vida. Na obra codificada por Roustaing – Os Quatro Evangelhos – lemos sobre o batismo, no 1º volume: "O batismo com o Espírito Santo é a comunhão com os Espíritos elevados que velam por vós; mas, para chegar a essa comunhão, era preciso, ao tempo da missão terrena de Jesus, e o é ainda, ser puro, cheio de zelo, de amor e de fé, como o eram os apóstolos fiéis" (p.184). "O batismo em Espírito Santo é a assistência, a inspiração dos Espíritos purificados, concedidas pelo Cristo, em nome do Senhor, aos homens, que então as recebem mediunicamente e mesmo se comunicam com aqueles Espíritos nas condições e na proporção das mediunidades que lhes são outorgadas" (p. 267). "O batismo por meio da água, que João Batista administrou e que Jesus recebeu para ensinar pelo exemplo, comprovando assim que esse batismo não passava de uma figura, era, a um tempo, material e simbólico; material pela ablução do corpo; simbólico pelo arrependimento e pela humildade que a ablução consagrava e que tinham a proclamá-los a confissão pública que diante de todos cada uma fazia, em voz alta, dos seus pecados, isto é, de suas faltas, de suas torpezas, de todas as infâmias que podem germinar no coração humano. O batismo pela água era, pois, uma preparação para o batismo pelo Espírito Santo e pelo fogo, batismo este que vem de Deus e que o Cristo defere aos que dele se tornam dignos, concedendo-lhes a assistência e o concurso dos Espíritos purificados" (p. 279). Ora, Jesus, como nos apresenta Pietro Ubaldi, era sem culpa, isento de expiação, vindo à Terra em missão, sem ter-se rebelado, sem ter caído como se rebelaram e caíram as demais criaturas humanas encarnadas. E ainda nos ensina que Jesus não esteve sujeito, para surgir entre nós, às leis biológicas aqui vigentes: "Que necessidade poderia ter o santo dos santos de passar pelos caminhos da dor? Não por si, decerto ele era perfeito, não tinha necessidade de purificação, de ascensão ou de redenção." "Ele desceu do inconcebível, com sua onipotência, sem alterá-lo." "Ele que era puro e inocente diante do mundo, tomou sobre os seus ombros nossas dores do passado, do presente e do futuro e assim se comportou diante da lei." "Somente ele não tinha a necessidade de viver e sofrer como nós, tardos para apreender, lentos no progredir, precisando de repouso, porque a natureza não dá salto." "Ele que nada tinha a aprender." (Ascese Mística, 4ª edição, Fundação Pietro Ubaldi-Fundápu, Campos, RJ, 1988, pp. 191, 193, 194 e 195.)
Perguntamos ainda como Jesus, sendo um Espírito Puro e Perfeito, sendo sem pecado e, portanto, nada tendo o que confessar, não necessitava receber batismo de João, conforme ele próprio declarou: "eu é que devo ser batizado por ti e tu vens a mim?" Mas Jesus quis apenas proporcionar a João e a toda a humanidade a oportunidade de ser apresentado como o Cristo, predito e prometido, obedecendo às profecias, declarando particularmente ao precursor: "Deixa-me fazê-lo por esta hora; porquanto é necessário que cumpramos a justiça."
Quanto à significação do aparecimento de uma pomba e da voz direta, durante a cerimônia de batismo de Jesus, no Jordão, à luz da doutrina dos espíritos é fácil compreender estas extraordinárias manifestações mediúnicas, as quais objetivaram impressionar o povo que assistia à cerimônia e dar uma demonstração de prova irrefutável de que ali estava o esperado Messias, o enviado de Deus – Jesus de Nazaré –, tanto que a voz direta, tomada pelo povo como "voz de Deus", teve a mesma significação, muito embora tenhamos aprendido que Deus não se comunica diretamente com o homem. Aquela voz, ouvida por todos, foi a de um dos emissários do Senhor.Esses fenômenos extraordinários, além de marcarem o início da pregação de Jesus, ensinaram-nos também uma lição sobre o valor da prece. O evangelista Lucas, no cap. III, v. 21 e 22, relata que "enquanto Jesus orava, o céu se abriu e um "espírito santo" desceu sobre ele, na forma corporal de uma pomba, e ouviu-se no céu uma voz que dizia: és meu filho bem amado, em ti hei posto todas as minhas complacências".
Mostra-nos assim que o auxílio sempre desce do Alto para aquele que ora com fé.Por outro lado, sem querer ferir determinados preconceitos religiosos, a Igreja Católica Romana passou a ministrar o batismo da água ao recém-nascido, ao contrário do de João, que só era dado ao adulto, após confessar-se de todos os pecados, em voz alta, e prometer iniciar nova vida. O pretexto da Igreja para assim proceder é o de, com aquele ato, apagar o chamado pecado original. Grande absurdo, ao tomarmos conhecimento de que, para aquela igreja, a alma é criada por Deus no momento de nascer a criança. Não admitindo a lei da reencarnação, ela promoveu um atraso moral/espiritual por mais de dez séculos.Fica cristalino que, admitindo tal ponto de vista, teríamos uma alma ou espírito imperfeito (devido ao pecado original), criado por Deus, que é infinitamente perfeito, para punir faltas dos pais! E teríamos, portanto, o imperfeito saindo das mãos da perfeição absoluta de Deus.
Porém, a doutrina espírita, explicando a lei da reencarnação e das vidas sucessivas, torna claros todos esses fatos aparentemente contraditórios. A criança que acaba de nascer realmente é de fato "uma pecadora", mas não devido às faltas de seus pais, e sim pelas faltas cometidas por ela mesma, através da lei de reciprocidade, justificada em existências anteriores. Ora, sob esse prisma, existe de fato o pecado original, pois, como sabemos, pela sapiência da lei de Justiça, ninguém vem ao planeta Terra sem já ter cometido alguma falta em existência anterior, por menor que ela seja, com exceção do nosso Governador Espiritual, guia e modelo para nosso aperfeiçoamento moral – Jesus que, por ser sem pecado, puro e perfeito, manifestou-se entre nós por incorporação fluídica e não por encarnação.Temos aí o verdadeiro e moderno conceito do pecado original, que será expurgado, não por uma cerimônia material (o batismo pela água) mas pelas provas e expiações desta vida, no curso da reencarnação que o espírito recebe a fim de aprimorar-se e evoluir, crescer e viver em plenitude.
O batismo de João ainda era compreensível, eis que expunha o neófito à humilhação da confissão pública, permitindo assim ao espírito um aperfeiçoamento mais rápido. Mas o batismo da Igreja Católica, sendo aplicado à criança, que ainda sequer terminou o seu processo reencarnatório (antes dos 7 anos de idade), espírito ainda em estado de inconsciência humana, não tem qualquer significação, constituindo-se apenas numa festa religiosa respeitável socialmente, porém desprovida de reais valores para o espírito imortal; se mal não faz, também por outro lado em nada beneficia o espírito e o progresso do homem.
O batismo pela água tem a mesma significação que a circuncisão instituída por Abraão, que também desaparecerá com o correr dos tempos. No 3º volume de Os Quatro Evangelhos (pp. 520 e 522 ), definem os evangelistas que "o batismo era símbolo material de aliança entre os cristãos. (...) Ser batizado (...) é colocar-se a criatura, verdadeiramente, sob a proteção de Deus, sob a do Mestre, protetor e governador do planeta, e sob a influência, a inspiração dos bons Espíritos do Senhor".
O batismo é sim a obrigação que assumimos para conosco e para com o Criador em proceder a nossa reforma integral, dominando as más inclinações, aplicando os talentos concedidos por Ele nas nossas existências em prol das criaturas, enfim, redescobrindo a nova era do espírito que, derrocando o império da matéria, nos proporcionará, um dia, como João, em missão superior, ocupar junto do Pai uma posição excepcional, vibrando no amor e fraternidade universais . Finalmente, a lucidez do espírito Emmanuel, em O Consolador (q. 298), define com rara beleza que "os espiritistas sinceros, na sagrada missão de paternidade, devem compreender que o batismo, aludido no evangelho, é o da invocação das bênçãos divinas para quantos a eles se reúnem no instituto santificado da família".

(Transcrito de O Franciscano, editado pela AssociaçãoEspírita Francisco de Assis, Rio de Janeiro, RJ,de 25.3.1997, revisto pelo autor.)
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 21:13