DA ÉTICA RELIGIOSA
Moral
Do latim popular: mor, moris (da terceira declinação) – costume.
Ética – do grego: éthikos – é um termo rigorosamente sinônimo do latino e que também tem o significado de “costume”, modo de viver, regras sociais; tanto assim é que deu em francês, derivado do latim, moeurs, uso, costume.
A moral é um capítulo da Filosofia e atualmente é estudada em conjunto com a Sociologia na parte a que se refere ao conhecimento dos costumes dos povos.
Como tal, é muito relativa; basta partir do princípio de que cada povo com seu costume, para se supor que, o que seja moral para uns não o será para outros.
Em princípio, levando-se em conta este acervo de condutas, pode-se ter em conta que o capítulo da Moral não seja uma Ciência perfeita, apenas um estudo de observação e constatação variável. Portanto, o espírita só tem que se preocupar com seus princípios doutrinários e nada mais; isto, admitindo-se que tenha se integrado e aceitado os ensinamentos dos Espíritos como lema de conduta.
O princípio fundamental ético está na conduta de cada um e isso foi o centro dos ensinamentos de Jesus: a prática do bem e a observância rigorosa das leis ditas naturais para cumpri-las como obrigação e respeito à existência universal, ou seja, à Criação. Não se precisa de cópias nem de estereótipo porque o espírita conhece, pelos ensinamentos que lhe são transmitidos em toda parte, pela Espiritualidade, que a boa conduta é aquela que constrói em vez de ferir, que não faz distinções nem privilégios, que integra a criatura na sociedade para ser mais um elemento capaz de torná-la melhor e apta ao progresso; que caminha junto com seu semelhante na ascensão, que repudia o erro e que não titubeia em condenar os maus exemplos.
A perfeição não se limita à prática do bem; inclui o repúdio ao mal, condena o erro e pune os que o cometem. Essa perfeição compete ao homem, está em cada um e se rege pelas leis imutáveis da Criação.
Não podemos interferir nela nem dela fugir.
A cada um segundo suas práticas, eis a grande máxima da moral.
Todos os grandes missionários tiveram frases antológicas que se tornariam repetitivas se fôssemos transcrevê-las. A filosofia exatista de Galileu poderá contê-las, no enunciado do equilíbrio, que nunca é demais repetir: A toda ação corresponde uma reação igual e contrária. Isto resume a filosofia de Jesus, quando disse: assim como fizeres, assim acharás. Já é consagrada a máxima: cada um constrói seu destino. Sem nos esquecermos do não faças a teu semelhante o que não quiseres que te façam.
Levando-se em conta que a parte religiosa do Espiritismo é bem distinta da de toda e qualquer Religião ou Seita, que não se prende a nenhuma delas e nem aceita a imposição pela determinação de seus mentores sacerdotais, também é de se admitir que seus preceitos, inclusive os morais, sejam rigorosamente distintos de toda e qualquer outra posição doutrinária.
Não é bem assim. Baseia-se o Espiritismo – e nunca é demais lembrar – na unanimidade das lições transmitidas aos encarnados pelos Espíritos, em toda a parte do globo. Desse modo, a moral espírita é coerente com todos os princípios correlatos com tais ensinamentos.
Por peculiaridade, tem em comum com as doutrinas reencarnacionistas o princípio de que as vidas sucessivas são sequenciais, onde cada ato presente acarreta uma decorrência futura, da mesma forma que, das encarnações pretéritas trazemos o destino presente.
Por outro lado, não pode nem deve se deixar influenciar por outras correntes contrárias, embora, a elas devote respeito, acatando-as, sem assimilá-las. Esta é a moral espírita.
Dos princípios éticos
Dentre os pensadores mais antigos, oficialmente registrados, destacam-se os filósofos chineses Shin Tó, Lau Tséu e Kung-Fu Tséu (Confúcio) que viveram, segundo registros, entre os anos 650 e 450 a.C., cabendo ao último destes os Preceitos de Bem-viver, um tratado de costumes dos mais perfeitos. Toda sua filosofia se resume em diferenciar o bem do mal, este como motivo de sofrimento e aquele como a virtude que deva ser alcançada. Todos reencarnacionistas.
Uma outra corrente de pensamento que influenciou a antiga civilização grega advém do Egito, do legendário Osíris, (*) que, tal como Jesus para os cristãos, acabou deificado pelos seus seguidores. Dele vêm as primeiras ideias do verdadeiro monoteísmo que influenciou o ocidente, contrapondo-se à mitologia grega correlata com a romana. Vamos encontrar seus princípios d e moral nos Lemas de Conduta, onde o fundamento principal ainda é a prática do bem como forma de procedimento em busca da perfeição. Nesse trabalho inspirou-se Nefertíti para fazer o código de Aton, junto com seu irmão e marido Akenaton (seguidor de Aton), combatendo a escola de Amon-Rá.
Mais recentemente, sem dúvida, o marco das leis morais por nós seguidas vai-se encontrar na obra de Aristóteles, Ética a Nicomaque, onde, tudo o que poderia se estabelecer para definir a boa conduta é realçado de forma categórica. Esta obra encerra a falada moral aristotélica e foi dedicada pelo filósofo grego a seu pai Nicomaque de Estagira e que se destacou, principalmente, por ser médico de Felipe II da Macedônia.
O trabalho de Aristóteles encaixa-se com perfeição na doutrina espírita.
O grande destaque do conhecimento histórico que nos interessa deve-se a Plutarco, filósofo grego, nascido por volta do ano 50 da nossa era, natural da Beócia que, após suas excursões pela África e pela Ásia, escreveu um compêndio de várias obras encerrando um tratado profundo sobre os estudos morais.
É tido pelos enciclopedistas (Diderot e Cia) como sendo um autor inspirado por um platonismo eclético e provavelmente seja o primeiro autor que tenha escrito esse tipo de trabalho que ainda hoje muito serve para se conhecer a moral dos povos antigos.
Allan Kardec, provavelmente impelido pela grande influência da Igreja, fez inserir no capítulo I do seu livro O Evangelho Segundo o Espiritismo (ESE), a Tábua dos Dez Mandamentos de Moisés que, segundo Mário Cavalcanti de Mello (meu prefaciador), no seu livro “Da Bíblia aos nossos Dias”, não passa de uma cópia grosseira e desdobrada dos Sete Preceitos de Vida da filosofia hindu. E que na Vulgata latina são apenas nove.
Essa Tábua peca, de imediato, pelo primeiro mandamento que sugere que o próprio Deus – como se fora humano – tenha estado ditando a Moisés suas ordens, lembrando que Ele teria tirado o povo judeu do Egito, ordenando que não se tivessem outros deuses estranhos pela Ele. Prudentemente, Kardec cortou essa parte do mandamento porque seria muito gritante um Deus perfeito a ordenar, como se disso precisasse para que se cumpram suas leis.
O segundo mandamento, desdobrado do primeiro, para dar dez, também é descabido posto que ambos pecam pelo princípio de que Deus seria uma criatura humanificada. E o restante se reveste de um materialismo profundo, apesar das recomendações prudentes que possam encerrar, além de não levar em conta o processo reencarnatório. E para nós, espíritas, isso é fundamental.
Contudo, dignificando sua parte sadia, podê-la-emos resumir num dos princípios básicos da moral espírita: – Não cometa nenhum crime.
Afinal, o crime não compensa, de acordo com o anexim, destacando-se dentre os contidos ou não na Tábua de Moisés, o roubo ou o furto, o assassinato, a injúria e a calúnia, o perjúrio e qualquer outra forma de atentado à integridade do seu semelhante, como a vingança e a desforra, mesmo como vindita, a justiça pelas próprias mãos, à execução letal e demais agressões físicas, e morais. De roldão, vemos que, na lista, está incluída a relação dos sete pecados capitais.
Por outro lado, o terceiro desses mandamentos só é válido para os judeus e fere a organização mundial dos dispositivos correlatos com os dias semanais, portanto, não é a moral dominante, ou seja, ter o sábado pelo domingo e se fosse cumprir a determinação de Moisés, o mundo poderia não virar um caos, mas ia ter muito transtorno.
No que se refere ao adultério, este não tem a mínima lógica porque só era aplicado contra as mulheres, tidas como seres inferiores e submissas ao homem. Pela lei reencarnatória, um espírito tem que saber nascer com qualquer um dos sexos, portanto, não há diferença espiritual entre eles.
Kardec foi muito mais sensato que Moisés ao escrever: – Quando o mundo for perfeito só haverá casais ligados pelo amor, pela compreensão e pela comunhão da vida; todos os outros laços ruir-se-ão.
E ainda garante que os pares serão perfeitos e indissolúveis para aquela existência terrena.
E a natureza concorda com isso porque, sempre que a humanidade se envereda pelas orgias, ela própria, natureza, cuida criar um dispositivo que compila as criaturas ao comedimento; foi assim com as doenças venéreas que encontraram a cura quando os homens aprenderam a se precaver contra o prazer orgíaco e depois, com a SIDA (ou AIDS) síndrome altamente contagiosa que atinge os toxicômanos e os desregrados sexuais, ambos mais do que promíscuos em seu modo de viver.
No campo da moral, um outro autor de destaque foi Immanuel Kant, co m sua obra Princípios Metafísicos de Moral, menos conhecida que suas Críticas, mas que, unindo os dois capítulos filosóficos, encerra profundos pensamentos de conduta dos quais, o destaque para o que, resumidamente, diz: – A razão acima de tudo, porém, é preciso que se conheça a razão, eis o fundamento para a moral sadia.
Kant foi um dos severos críticos a certos preceitos de vida tidos como éticos para várias sociedades e, impiedosamente, condena-os.
Para Pierre Abélard, teólogo escolástico francês (1079 -1142), a moral humana reside na sua vontade; apaixonado por Héloise de Nantes casara-se secretamente com ela, o que acirrou a ira do sempre pio Cônego Fulbert, tio da moça que, como castigo, mandou castrá-lo. Só assim perdeu sua vontade.
Contudo, tem-se que convir que este filósofo está certo; cada povo cria sua moral segundo suas conveniências.
Um outro pensador de destaque – já citado no Panteísmo – a preocupar-se com os costumes foi Baruch Spinoza (1632-77) que, ao lado do seu famoso “Tratado Político”, escreveu outro livro intitulado “Ética” onde expõe uma série confusa de coisas, idealiza um Deus estranhamente composto de substâncias de pensamento na defesa de um panteísmo liberal e declara que a moral é um pensamento de Deus. Sua popularidade entre os filósofos é grande.
Diversos autores, alguns com conclusões absurdas – e, assim mesmo, com seguidores –, a maioria presa à vida material e a seus costumes sócio-financeiros, dedicaram-se ao estudo da ética em si, só que, para os preceitos espíritas, não apresentaram nenhum conteúdo digno de destaque.
Uma Entidade espiritual, através de comunicação mediúnica, declarou-nos que a conduta dos outros pensadores não influi na moral dos espíritas; para o bem não há regras.
Conclusão
Como consequência moral, temos: – a cada um segundo seus méritos.
Todo o estudo ético pode ser definido da seguinte maneira:
– O princípio da moral humana reside nos preceitos da vida espiritual para a qual o encarnado se prepara, através de vidas sucessivas.
– Ter como conduta um procedimento reto e ilibado, respeitar seu semelhante e só praticar atos que não contrariem o equilíbrio universal dentro da área social.
Eis a sabedoria dos costumes da vida.
Carlos Imbassahy – obra E... Deus Existe?
__________
(*) N. da R. - As narrativas egípcias que envolvem esse legendário personagem estão contidas no livro Lendas de Osíris, do mesmo autor.