Sábado , 03 de Setembro DE 2011

DO PECADO ORIGINAL SEGUNDO O JUDAÍSMO

 

Pode ser interessante, para aqueles que o ignoram, conhecer a doutrina dos Judeus com respeito ao pecado original; pedimos emprestada a explicação seguinte ao jornal israelita, Ia Famille de Jacob, que se publica em Avignon, sob a direção do grande rabino Benjamin Massé; número de julho de 1868.

 

"O dogma do pecado original está longe de estar entre os princípios do Judaísmo. A lenda profunda que o Talmud (Nida XXXI, 2) e que representa os anjos fazendo a alma humana, no momento em que ela vai se encarnar num corpo terrestre, prestar juramento de se manter pura durante a sua estada neste planeta, a fim de retornar pura junto do Criador, é uma poética afirmação de nossa inocência primitiva e de nossa independência moral da falta de nossos primeiros pais, Essa afirmação, contida nos livros tradicionais, está conforme o verdadeiro espírito do Judaísmo.

"Para definir o dogma do pecado original, bastar-nos-á dizer que se toma pela letra o relato da Gênese, do qual se desconhece o caráter lendário, e que, partindo desse ponto de vista errado, aceitam-se cegamente todas as conseqüências que dele decorrem, sem se importar com a sua incompatibilidade com a natureza humana e com os atributos necessários e eternos que a razão reporta à natureza divina.

"Escravos da letra, afirmam-se que a primeira mulher foi seduzida pela serpente, que ela comeu de um fruto proibido por Deus, e que ela o fez comer a seu esposo, e que, por esse ato de revolta aberta contra a vontade divina, o primeiro homem e a primeira mulher incorreram na maldição do céu, não só por eles, mas por seus filhos, mas por sua raça, mas pela Humanidade inteira, para a Humanidade cúmplice por qualquer ausência da duração que ela se encontra dos culpados, cúmplice de seu crime, do qual ela é, conseqüentemente, responsável em todos seus membros presentes e futuros.

"Segundo essa doutrina, a queda e a condenação de nossos primeiros pais foram uma queda e uma condenação para a sua posteridade; desde então, para o gênero humano, os males inumeráveis que teriam sido sem fim, sem a mediação de um Redentortão incompreensível quanto o crime e a condenação que o chamam. Do mesmo modo que o pecado original de um único foi cometido por todos, do mesmo modo a expiação de um único será a expiação de todos; a Humanidade, perdida por um único, será salva por um só: a redenção é a conseqüência inevitável do pecado original.

"Compreende-se que não discutimos essas premissas com as suas conseqüências, que não são para nós mais aceitáveis do ponto de vista dogmático do que do ponto de vista moral.

"Nossa razão e nossa consciência jamais se acomodarão com uma doutrina que apaga a personalidade humana e a justiça divina, e que, para explicar as suas pretensões, nos faz viver todos juntos, na alma como no corpo, do primeiro homem, ensinando-nos que, embora numerosos que sejamos na sucessão das idades, fazemos parte de Adão em espírito e matéria, que tomamos parte em seu crime, e que devemos ter a nossa parte nessa condenação.

"O sentimento profundo de nossa liberdade moral se recusa a essa assimilação fatal, que nos tiraria nossa iniciativa, que nos acorrentaria apesar de nós num pecado longínquo, misterioso, do qual não temos consciência, e que nos faria sofrer um castigo ineficaz, uma vez que aos nossos olhos ele não seria merecido.

"A idéia indefectível e universal que temos da justiça do Criador se recusa muito mais energicamente ainda em crer no compromisso, na falta de um só, dos seres livres criados sucessivamente por Deus na seqüência dos séculos.

"Se Adão e Eva pecaram, só a eles pertence a responsabilidade de sua ação má; só a eles sua queda, sua expiação, sua redenção por meio de seus esforços pessoais para reconquistar a sua nobreza. Mas nós, que viemos depois deles, que, como eles, temos sido o objeto de um ato idêntico da parte do poder criador, e que devemos, a esse título, ser de um prêmio igual ao do nosso primeiro pai aos olhos de nosso Criador, nós nascemos com a nossa pureza e a nossa inocência, das quais somos os únicos senhores, os únicos depositários, e cuja perda ou conservação não dependem absolutamente de nossa vontade, quanto das determinações de nosso livre arbítrio.

"Tal é, sobre esse ponto, a doutrina do Judaísmo, que não poderia nada admitir que não esteja nada conforme à nossa consciência esclarecida pela razão."

B. M.

Revista Espírita Setembro de 1868

tags:
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 08:46
Sexta-feira , 05 de Agosto DE 2011

PLURARIDADE DAS EXISTÊNCIAS

 

Compreendam e não esqueçam nunca que, pela pluraridade das existências e corformemente ao grau de culpabilidade, as provações e as expiações, tendo por fim a purificação e o progresso são apropriadas às faltas cometidas nas encarnações precedentes. Assim, por exemplo, o senhor de ontem, duro e arrogante, que faliu nas suas provas como senhor, fossem quais fossem, dentro da ordem social, sua posição ou seu poder na terra, é o escravo, o servo, ou criado de amanhã. O sábio que ontem, materialista e orgulhoso, abusou de sua inteligência, da sua ciência, para desencaminhar os homens, para perverter as massas populares, é o cego, o idiota ou o louco de amanhã. O orador de ontem, que abusou gravemente da palavra para arrastar os homens ou os povos a erros profundos, é o surdo mudo do dia seguinte. O que ontem dispôs da saúde, da força, ou da beleza física e gravemente abusou de tudo isso, é o sofredor, o doente, o raquítico, o desertado da natureza, o enfermo de amanhã. Se é certo que os corpos procedem dos corpos, não menos certo é que são apropriados às provações e às expiações por que o Espírito haja de passar e que a encarnação se dá no meio e nas condições  adequados ao cumprimento de tais provações e expiações. É o que explica como e porque, na mesma família, dois filhos, dois homens nascidos do mesmo pai e da mesma mãe, se encontram em condições físicas tão adversas, tão opostas. De igual modo a diferença nas provações, a disparidade do avanço realizado nas existências precedentes explicam porque e como, do ponto de vista moral ou intelectual, esses dois irmãos se acham em condições tão adversas, tão opostas.

Compreenda o homem e não se esqueça nunca que o mais próximo e mais querido parente de ontem, que o mais amigo da véspera podem vir a ser e são muitas das vezes o estranho, o desconhecido do dia seguinte, que ele a todo instante poderá encontrar, acolher ou repelir.

Que, pois, os homens, cientes e compenetrados de que a vida humana e as condições sociais são provações e ao mesmo tempo meio e modo de amparo e de concurso recíproco nas vias da reparação e do progresso, pratiquem a lei de amor, partilhando mutuamente o que possam de natureza material ou intelectual, dando aquele que tem ao que não tem, dando de coração o auxílio do coração, dos braços, da bolsa, da inteligência, da palavra e, sobretudo do exemplo. Então, quando tal se verificar, estarão cumpridas em toda verdade, sob os auspícios e a pratica da fraternidade recíproca e solidária, estas palavras de Jesus: “Basta ao discípulo ser como o mestre e ao servo como o senhor”.

Trecho retirado do livro “OS QUATRO EVANGELHOS” de J.B.Roustaing.

Recebido mediunicamente pelos apóstolos Mateus, Marcos e Lucas.

Páginas 192 e 193. 

 

tags:
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 09:22
Quarta-feira , 09 de Março DE 2011

ESPÍRITA NÃO CONDENA NINGUÉM

1. Existe, na tradição forense, uma idéia segundo a qual os espíritas são os jurados que melhor atendem aos interesses da defesa, uma vez que, de acordo com a voz corrente, “espírita não condena ninguém”. Durante mais de trinta anos de atuação na tribuna do júri, não conseguimos comprovar o acerto dessa afirmativa. Constatamos, isto sim, uma grande tendência condenatória entre os seguidores das religiões reformadas, e uma acentuada indefinição entre os católicos, que ora pendem para um lado, ora para o outro.

Como constituem a maioria do universo religioso brasileiro, são, por conseguinte, os mais visados e os que mais sofrem as influências de toda sorte a que se acham sujeitos os jurados de um modo geral. Por isso, torna-se difícil uma conclusão mais concreta a respeito de suas tendências. O certo é que as mais absurdas decisões do Tribunal do Júri, tanto absolutórias como condenatórias, partem, geralmente, de conselhos de sentença dos quais não participam seguidores de outros credos religiosos. Atualmente, com crescimento da Igreja Universal, e de outras que guardam semelhança com ela, o fenômeno vem perdendo sua força, sobretudo no que tange à aceitação pela sociedade dos chamados “crentes”, o que nem sempre acontece com relação ao Espiritismo e aos espíritas.

 

2. Nenhum argumento sério autoriza a existência desse procedimento, a não ser o preconceito e o radicalismo religioso. Durante algum tempo, quando ainda não conhecíamos nada de Espiritismo, aceitamos tal entendimento sem maiores indagações e sem a menor preocupação de sondar a sua veracidade. Agimos, neste caso, com a tranqüilidade própria dos ignorantes. Mais tarde, já devidamente esclarecidos a seu respeito, constatamos que tudo não passava de mais um dos enormes equívocos que boa parte das pessoas alimenta quanto a ele, Espiritismo.

Verificamos, por outro lado, que os jurados espíritas condenavam ou absolviam, tanto quanto os demais.

É de se lamentar, no entanto, que essa falsa visão não se acha restrita apenas aos não-espíritas, porquanto é perfilhada por muitos que se dizem adeptos da Doutrina.

Trata-se de um dos muitos problemas que a perspicácia de Allan Kardec detectou, conforme se pode ver no capítulo XXIX, item 334, de O Livro dos Médiuns.

O termo espírita carrega, no entendimento vulgar, uma série de conotações eivada de erros e de preconceitos. Abrange um universo enorme, que vai desde os integrantes do sincretismo religioso, sob as suas variadas denominações, até aos seguidores dos cultos e das seitas em que o exotismo ocupa o lugar de maior destaque, passando, ainda, pelas inúmeras veredas de quantos se definem espiritualistas. Essas formas de religiosidade, embora merecedoras de respeito, não guardam nenhuma afinidade com a Doutrina dos Espíritos, e a confusão, consciente ou inconsciente, que se estabeleceu entre elas e o Espiritismo, enseja raciocínios e ilações inteiramente distantes da verdade, como a de se imputar aos espíritas uma conduta de alienação em face das questões sociais. Essa atitude os acompanharia também, quando convocados a julgar seus irmãos pelo cometimento de um ilícito penal, cujo julgamento se inscreve no rol dos que são da competência do Júri Popular, fixada pelo artigo 5o, XXXVIII, da Constituição Federal.

 

3. O raciocínio peca, contudo, pela total ausência de razão. Ao espírita não é vedado julgar, ainda que desse encargo advenha a inevitável aplicação de uma pena.

Ele, como qualquer outro cidadão, não pode fugir da responsabilidade que o Estado lhe delegou, ao convocá-lo para o serviço do júri. Seria ótimo se a sociedade moderna já não mais convivesse com a criminalidade e que, no lugar das penitenciárias e das cadeias, estivesse edificada uma escola. Todavia, esse grau de desenvolvimento e evolução ainda se acha muito distante de ser alcançado.

A pena, por isso mesmo, no estágio atual da Humanidade, permanece, teoricamente, como o instrumento mais eficaz de que a sociedade dispõe para restabelecer o equilíbrio social abalado pela ação do delinqüente.

A concepção de que o espírita, por uma questão de princípios, não condena ninguém não se harmoniza com o sentimento de responsabilidade que a ele cabe assumir diante de si, de Deus e da sociedade, sob pena de ser considerado, nos termos do magistério de Kardec, mais um “espírita de nome” (a respeito, Revista Espírita, novembro de 1861, p. 495).

 

4. O que Jesus proscreveu foi o julgamento apressado, afoito, impregnado de má-fé, no qual, muitas vezes, a verdadeira intenção do julgador permanece oculta, a exemplo do que ocorreu no episódio envolvendo a mulher adúltera.

No Sermão do Monte (Mateus, 7: 1 e 2), Ele nos adverte quanto a essa maneira de julgar. Ela é típica do chamado juízo temerário, caracterizado pela impiedade ou ditado pelas aparências que, costumeiramente, enganam.Uma interpretação exclusivamente literal e isolada desses dois versículos poderia levar à absurda conclusão de que toda e qualquer forma de julgamento é defesa aos cristãos. Os juízes de direito seriam, pois, vítimas de uma autêntica “injustiça divina”, porquanto nenhuma esperança teriam quanto à sua vida futura, em face de sua própria atividade profissional.

Não obstante, todos sabemos da sua importância dentro da sociedade, em virtude dos constantes e cada vez mais numerosos conflitos que afloram a todo instante em seu seio, e do elevado índice de criminalidade dos dias atuais.

 

5. O sentido da proibição se completa e se integra no contexto evangélico através dos versículos 3, 4 e 5 da mesma narrativa de Mateus: – “E por que reparas tu no argueiro que está no olho do teu irmão, e não vês a trave que está no teu olho?

Ou como dirás a teu irmão:

Deixa-me tirar o argueiro do teu olho, estando uma trave no teu?

Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então, cuidarás em tirar o argueiro do olho do teu irmão”.

De mais a mais, durante o seu messiado, Jesus, em diversas oportunidades, estabeleceu juízos de valor, e, em conseqüência, julgou, contrariando, dessarte, os que sustentam a proibição absoluta do julgamento. Na sua explicação sobre a gravidade e a dimensão das ofensas feitas ao nosso irmão, foi de meridiana clareza ao não excluir do julgamento humano os autores dessas ofensas: “Ouvistes que foi dito aos antigos:

Não matarás; mas qualquer que matar será réu de juízo.

Eu, porém, vos digo que qualquer que, sem motivo, se encolerizar contra seu irmão será réu de juízo, e qualquer que chamar a seu irmão de raca será réu do Sinédrio; e qualquer que lhe chamar de louco será réu do fogo do inferno”. (Mateus. 5:21-23.)

A expressão réu de juízo significa os diversos graus da Justiça humana: a outra, réu do Sinédrio, se refere à Justiça de Deus. A primeira, contudo, não exclui a segunda, em virtude de sua inexorabilidade, traduzida pela regra imperativa do a cada um será dado de acordo com suas obras. Ninguém, mesmo quem já foi compelido a prestar conta de suas ações ao Judiciário terreno, está isento de ser julgado e sancionado pela Justiça Divina. Isso integra o seu mecanismo operacional, que jamais dispensa a “reparação pelo dano causado”, exigindo que, na execução de suas penas, “até o último jota e o último ponto” sejam fielmente cumpridos.

O episódio da interpelação do Cristo acerca da licitude, ou não, do pagamento dos impostos devidos a Roma ratifica inteiramente esse entendimento, uma vez que Ele fez questão de destacar a existência de duas espécies de jurisdição, a humana e a divina, mandando dar a Deus o que era de Deus e ao homem o que lhe pertencia.

 

6. A única conclusão razoável diante da posição evangélica quanto ao julgamento é a de que ela se reveste de caráter relativo, e não absoluto, não obstante as ratificações posteriores de Paulo e Tiago (Romanos, 14:13 e Epístola Universal, 4:12, respectivamente). Tomada ao pé da letra importaria em um verdadeiro caos para toda a Humanidade e nenhuma organização política conseguiria sobreviver à falência que provocaria.

Todo homem de bem, profitente de qualquer religião que seja, não deve, pois, julgar pelas aparências, movido pela simpatia ou antipatia, pelos interesses políticos, pelas rivalidades de qualquer espécie, pelas filiações religiosas, enfim, por todos os fatores que atuam na formação da opinião pública e que, na maioria das vezes, somente se prestam para conduzir ao passionalismo irracional e a injustiças inomináveis.

Qualquer julgamento, sobretudo aqueles da competência da Justiça Criminal, deve procurar sempre o amparo da verdade histórica, embora essa nem sempre se identifique com a verdade processual.

Nos casos duvidosos, mal esclarecidos ou tendenciosos, a consciência jurídica, calcada na noção do justo e do injusto que cada um traz dentro de si, não autoriza uma decisão condenatória. Não se trata, porém, de apanágio exclusivo de alguma confissão religiosa, porquanto nada mais é do que a simples aplicação de um brocardo jurídico de tradição milenar.

É o famoso in dubio pro reo do Direito Romano, ainda de uso corrente na atualidade, cuja existência é anterior ao Cristianismo e que, em face disso, não pode ser invocado para justificar a inverídica proibição de julgar e condenar imputada aos espíritas.

 

Setembro 2006 • Reformador

tags:
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 19:46
Domingo , 14 de Novembro DE 2010

O ESPIRITISMO NO FUTURO

 

 

     Cada dia o Espiritismo estende o círculo de seu ensino moralizador. Sua grande voz repercutiu de um extremo ao outro da Terra. A sociedade se comoveu com ela e de seu seio partiram adeptos e adversários.

 

     Adeptos fervorosos, adversários hábeis, mas cuja mesma habilidade e renome serviram à causa que queriam combater, chamando para a doutrina nova a atenção das massas e lhes dando o desejo de conhecer os ensinos regeneradores, que seu adeptos preconizam e que os faziam escarnecer e pôr em ridículo.

 

     Contemplai o trabalho realizado e alegrai-vos com o resultado! Mas que efervescência indizível se produzirá entre os povos, quando de seus mais amados escritores vierem juntar-se aos nomes mais obscuros e menos conhecidos dos que se comprimem em redor da bandeira da verdade!

 

     Vede o que produziram os trabalhos de alguns grupos isolados, na maioria entravados pela intriga e pela má vontade e julgai da revolução que se operará, quando todos os membros da grande família espírita se derem as mãos e declararem, fronte alta e o coração firma, a sinceridade de sua fé e de sua crença na realidade do ensinamento dos Espíritos.

 

     As massas gostam do progresso, buscam-no, mas o temem. O desconhecido inspira um secreto terror aos filhos ignorantes de uma sociedade embalada pelos conceitos, que ensaia os primeiros passos na via da realidade e do progresso moral. As grandes palavras liberdade, progresso, amor, caridade ferem o povo sem o comover; muitas vezes ele prefere seu estado presente e medíocre a um futuro melhor, mas desconhecido.

 

     A razão desse temor do futuro está na ignorância do sentimento moral num grande número, e do sentimento inteligente em outros. Mas não é certo, como disseram vários filósofos célebres, que uma concepção falsa da origem das coisas tenha feito errar, como eu mesmo o disse, - porque coraria de o dizer? não pude enganar-me? - não é certo, digo eu, que a humanidade seja má por essência. Não; aperfeiçoando a sua inteligência, ela não dará um impulso maior às suas más qualidades. Afastai de vós esses pensamentos desesperadores, que repousam num falso conhecimento do espírito humano.

 

     A humanidade não é má por natureza; mas é ignorante e, por isso mesmo, mais apta a se deixar governar por suas paixões. É progressiva e deve progredir para atingir os seus destinos; esclarecei-a; mostrai-lhe seus inimigos ocultos na sombra; desenvolvei sua essência moral, nela inata, e apenas entorpecida sob a influência dos maus instintos e reanimareis a centelha da eterna verdade, da eterna presciência do infinito, do belo e do bom, que reside para sempre no coração do homem, mesmo o mais perverso.

 

     Filhos de uma doutrina nova, reuni as vossas forças; que o sopro divino e o socorro dos bons Espíritos vos sustentem, e fareis grandes coisas. Tereis a glória de haver posto as bases dos princípios imperecíveis, cujos frutos vossos descendentes recolherão.

 

(Espírito de Montaigne - Revista Espírita de 1868).  

 

OBSERVAÇÃO DO COMPILADOR: Michel Eyquem de Montaigne, escritor francês - 1533/1592. Freqüentou a Corte. Sua obra principal denominou-se Ensaios. Para Montaigne a Arte de Viver "funda-se numa sabedoria prudente, inspirada no bom senso e no espírito de tolerância"

tags:
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 20:45
Sábado , 23 de Outubro DE 2010

A VERDADE DE CADA UM

É inadmissível, que nos dias atuais, às vésperas do 3º milênio, quer através da imprensa escrita, falada e televisiva, vejamos "fiéis" de determinadas religiões desenvolverem verdadeiras batalhas contra profitentes de outras crenças. Alguns, para alcançarem seus objetivos - aniquilar o inimigo - não titubeiam em lançar mão dos argumentos mais descabidos, até mesmo da mentira, se necessário for. Aqui comigo penso: se os religiosos, que pregam o entendimento, o perdão e paz, agem dessa maneira, imaginem os demais ...

Não há nenhum constrangimento em que sejam expostas as mazelas do próximo nos programas de TV, para depois então, mostrar a "religião salvadora". A dor e os problemas das pessoas são tratados como "produtos" na busca de conversões, num "marketing" proselitista sem pudor nem antecedentes, verdadeiro comércio da fé.

É lamentável que os homens "ainda sejam tão crianças no entendimento", como no dizer de São Paulo, perdendo tempo com discussões improdutivas, que não conduzem a lugar algum. Esquecem-se, que mais importante do que o rótulo é o conteúdo; mais importante que as aparências, são as atitudes. Depois, cada um tem o direito - inclusive assegurado pela Constituição do nosso país -,  no que diz respeito às crenças e cultos, de seguir o caminho que bem entender, de acreditar no que bem quiser.

Por uma questão de respeito à liberdade de pensamento, temos o dever de aceitar o posicionamento religioso dos outros; se não por isto, pelo menos por educação. Afinal, o preconceito e a discriminação já fizeram milhões e milhões de vítimas ao longo da história da humanidade.

A Idade Média ficou para trás, graças a Deus. Os tempos das "cruzadas" e da "santa inquisição", quando  tentavam impor "verdades" à custa de ferro e fogo, fazem parte apenas de um período obscuro e lamentável da nossa historicidade.

Os habitantes da Terra, lá para o final do 3º milênio, custarão a acreditar que um dia, homens foram escravos de outros homens; que existiu segregação racial nos Estados Unidos, motivo de vergonha para a maior "democracia" do mundo; que uns, por terem nascidos judeus, foram perseguidos e dizimados pelo Reich alemão; que outros, por serem arábes, foram vistos com desconfiança; que na Irlanda, católicos e protestantes, travaram uma guerra secular, sangrenta e desumana, pela disputa do poder em nome do Cristo. E, que ainda se achavam civilizados ...

Chega! É preciso que alguém grite, chamando todos a uma profunda reflexão, revendo conceitos e valores. De que valeram - é bom que se pergunte - os exemplos de Jesus, Buda, Krisna, Francisco de Assis e tanto outros iluminados que passaram pela Terra? De que valeram os sacrifícios de Ghandi, Martin Luther King e outros que ofereceram voluntariamente a própria vida em nome dos direitos humanos, de uma sociedade mais justa e da paz? De que têm valido os ensinamentos vivos que nos foram legados por Albert Schweitzer (evangélico), Madre Teresa de Calcutá e Irmã Dulce (religiosas católicas) e por Chico Xavier (espírita), todos desenvolvendo incansáveis tarefas humanitárias?

Numa entrevista concedida à Revista Planeta, um dos grandes pensadores dos nossos dias, Frei Leonardo Boff, cita uma frase creditada ao Dalai Lama, líder espiritual do Tibet que, acredito, pode ser uma luz a clarear o entendimento dos religiosos ortodoxos: "A melhor religião é a que te faz melhor."

Entretanto, cada um quer ser dono da verdade, se possível, com exclusividade reconhecida. E, isso, convenhamos, é uma tola presunção de quem quer impor seus pontos de vista. Quem tenta convencer ao outro é aquele que ainda não conseguiu convencer a si mesmo.

Geralmente, os que já percorreram o caminho e já atingiram o objetivo, são serenos, justos, e neles, a humildade é um estado natural. Não criticam nem julgam, porque têm a consciência de que aqueles que vem atrás, mesmo tropeçando e caindo, também chegarão ao objetivo desejado, independente do caminho que tenham escolhido. Sabem, que a Luz não se impõe - é conquista de cada um.

Nem mesmo Jesus, em toda a sua sabedoria, quando questionado por Pilatos, se arriscou a definir a Verdade, preferindo silenciar. Talvez, porque a Verdade não deva ser conceituada, mas sim, vivenciada em toda a sua plenitude, através de uma busca incessante, de um constante caminhar, como no dizer de Sérgio de Souza Carvalho, em o Mestres da Terra: "O caminho dever ser percorrido e não discutido. A compreensão vem do fazer e não do falar:"

"Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará" - afirmou Jesus - mas, não a definindo, deixou claro que cada um terá que encontrar sua própria Verdade, escolher sua trajetória particular para poder atingi-la. Assim, a coragem libertará o medroso; a cura libertará o doente; a educação libertará o ignorante; a reparação da falta libertará o criminoso; a esperança libertará o pessimista; a hulmidade libertará o orgulhoso e, desse modo, cada um encontrará a "sua verdade", ao seu modo, tempo e lugar. Portanto, ninguém tem o direito de querer "impor" a sua verdade - ou o que julga ser verdade -, a quem quer que seja.

Se ainda não somos sábios o suficiente para fazermos nossas as palavras de Sócrates, "Só sei que nada sei", ao menos sejamos educados, respeitando as convicções de cada um. É o mínimo exigido pelo bom senso.

tags:
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 13:45
Terça-feira , 28 de Setembro DE 2010

AMIGOS ESPIRITUAIS

 

Providência Divina manifesta-se, incessantemente, em todas as situações e lugares, proporcionando vasta gama de recursos, com vistas à proteção, ao futuro e ao progresso das criaturas.

Esse amparo acontece de infinitos modos. Um deles dá-se por intermédio de tutores espirituais, conhecidos, no meio espírita, pelo nome de guias ou amigos espirituais.

É grandiosa e sublime a doutrina dos guias espirituais, pois revela a providência, a bondade e a justiça do Criador para com seus filhos, provendo-os de meios para o aperfeiçoamento.

Para efeitos didáticos, Kardec classificou os guias espirituais em três categorias: Espíritos protetores, Espíritos familiares e Espíritos simpáticos. (1)

O Espírito protetor, ou anjo guardião, é sempre um bom Espírito, mais evoluído. Trata-se de um orientador principal e superior.

Sua missão assemelha-se à de um pai com relação aos filhos: a de orientar o seu protegido pela senda do bem, auxiliá-lo com seus conselhos, consolá-lo em suas aflições, levantar-lhe o ânimo nas provas da vida. Os Espíritos protetores não constituem seres privilegiados, criados puros e perfeitos, mas sim “[...] Espíritos que chegaram à meta, depois de terem percorrido a estrada do progresso [...]”. (2)

São as almas que já trilharam as experiências de diferentes reencarnações – as mesmas pelas quais estamos passando –, e conquistaram, pelo próprio esforço, uma ordem elevada. (3)

A missão dos Espíritos protetores tem duração mais prolongada, pois estes acompanham o protegido desde o renascimento até a desencarnação, e muitas vezes durante várias existências corpóreas. Entretanto, a atuação do protetor espiritual não é de intervenção absoluta, pois, apesar de influir em nossa vontade, evita tomar decisões por nós e contra o nosso livre-arbítrio.

Sente-se feliz quando acertamos e sofre quando erramos, embora esse sofrimento não seja revestido das mesmas paixões humanas, porque ele sabe que, mais cedo ou mais tarde, o seu tutelado voltará ao bom caminho.

Os Espíritos protetores dedicam-se mais à orientação de uma pessoa, em particular, não deixando, entretanto, de velar por outros indivíduos, embora o façam com menos exclusividade. Exercem supervisão geral sobre nossas existências, tanto no aspecto intelectual, incluindo as questões de ordem material, (4) quanto moral, emprestando ênfase a esta última, por ser a que tem preponderância em nosso futuro de seres imortais.

Os Espíritos protetores, em realidade, jamais abandonam os seus protegidos, apenas se afastam ou “dão um tempo” quando estes não ouvem os seus conselhos.

Desde, porém, que chamados, voltam para os seus pupilos, a fim de auxiliá-los no recomeço.

Por isso, atentemos aos conselhos de Joanna de Ângelis:

Tem cuidado para que te não afastes psiquicamente do teu anjo guardião.

Ele jamais se aparta do seu protegido, mas este, por presunção ou ignorância, rompe os laços de ligação emocional e mental, debandando da rota libertadora.

Quando erres e experimentes a solidão, refaze o passo e busca-o pelo pensamento em oração, partindo de imediato para a ação edificante. (5)

Momento chega, porém, em que o aprendiz deixa de ser tutelado.

Isso acontece quando o Espírito atinge o ponto de guiar-se a si mesmo, estágio que, por enquanto, não se dá na Terra, planeta de expiação e provas. (6)

Os Espíritos familiares(7) são orientadores secundários. Embora menos evoluídos, igualmente querem o nosso bem. Podem ser os Espíritos de nossos parentes, familiares ou amigos. Seu poder é limitado e sua missão é mais ou menos temporária junto ao protegido.

Ocupam-se com as particularidades da vida íntima do protegido e só atuam por ordem ou com permissão dos Espíritos protetores, como, por exemplo, quando o socorrido está recalcitrante e não ouve os conselhos superiores ou apresenta comportamento enigmático. Nessa hipótese, o Espírito familiar, por ter mais intimidade e vínculos sentimentais com o protegido, é aceito como colaborador, de modo a auxiliar na solução de problemas específicos.

Podem, por exemplo, influenciar na decisão de um casamento, (8) nas atividades profissionais(9) ou mesmo na tomada de decisões importantes que envolvam o cumprimento da lei de causa e efeito, (10) conforme a necessidade do atendido.

Já os Espíritos simpáticos podem ser bons ou maus, conforme a natureza das nossas disposições íntimas. Ligam-se a nós por uma certa semelhança de gostos, de acordo com nossas inclinações pessoais. A duração de suas relações, que também são temporárias, se acha subordinada a determinadas circunstâncias, vinculadas à persistência dos desejos e do comportamento de cada um. Se simpatizam com nossos ideais, com nossos projetos, procuram nos ajudar e,muitas vezes, tomam nossas dores contra nossos adversários, situação em que não contam com o beneplácito dos Espíritos protetores.

Portanto, ninguém, absolutamente ninguém, está desamparado.

Entretanto, Deus não nos atende pessoalmente, conforme nossos caprichos, mas por intermédio das suas leis imutáveis e de seus mensageiros, isto é, Deus auxilia as criaturas por intermédio das criaturas. Apesar disso, os orientadores espirituais não fazem por nós o trabalho que nos compete para o nosso crescimento moral e intelectual. Não existe parcialidade nem privilégio nas leis divinas, ou seja, cada um recebe de acordo com o seu merecimento, de conformidade com seus esforços.

O amigo espiritual comparece quando é invocado, por meio de uma simples prece.

Para ele, não há distância, lugar, tempo ou barreiras que o impeçam de atender a um apelo sincero, seja onde for: no lar, nos hospitais, nas ruas, no trabalho, nos cárceres e mesmo nas furnas da devassidão.

A ação dos orientadores espirituais é oculta, porque, se nos fosse permitido contar sempre com eles, seríamos tolhidos em nossa livre iniciativa e não progrediríamos.

Nisso também está a sabedoria divina, porque assim desenvolvemos melhor nossa inteligência e ganhamos mais experiência. Do contrário, permaneceríamos estacionados, como no caso de certos pais que sempre fazem tudo para os filhos, poupando-os de aborrecimentos e dificuldades, e, com isso, tirando deles a oportunidade do aprendizado e da experiência, com graves prejuízos para a sua formação moral.

Os Espíritos infelizes, ainda presos nas malhas da ignorância, que se empenham em nos desviar do bom caminho, por meio dos maus pensamentos e de outras estratégias que encontram motivação em nossas próprias fraquezas, não têm missão de fazer o mal.

Praticam esses atos por sua própria conta e responsabilidade e um dia terão que resgatar seus erros.

São Espíritos ainda atrasados moralmente, quais fomos um dia – de cujas mazelas também não nos libertamos integralmente –, e que, por sua vez, igualmente despertarão para o bem. Sua presença, entre nós, é útil, porque permite o adestramento de nossas faculdades, constituindo mesmo um campo de provas ou expiações, cujos obstáculos nos compete superar, na busca de caminhos alternativos para a libertação de nossas imperfeições que, na realidade, são o chamariz desses supostos adversários.

Como visto o Pai não nos cria a esmo, sem proteção, planejamento e finalidade. Dá-nos, em plenitude, todos os suprimentos necessários ao nosso desenvolvimento, tendo nos Espíritos protetores “[...] os mensageiros de Deus, encarregados de velar pela execução de seus desígnios em todo o Universo, que se sentem ditosos com o desempenho dessas missões gloriosas [...]”, (11) protetores esses que se utilizam do auxílio ou assessoramento dos guias espirituais das classes menos elevadas.

Os anjos ou protetores espirituais de hoje são os homens de ontem, que evoluíram, deixando para trás a animalidade. Essa ligação e interdependência entre os Espíritos das diversas faixas evolutivas, em permanente contato com o plano físico, formam o caleidoscópio da grande família universal, evidenciando as leis da unidade da Criação e da solidariedade entre os seres.

Deus, nosso Pai, não nos quer como autômatos, mas sim como parceiros, cocriadores, coparticipes, que temos a ventura de alcançar a perfeição pelas próprias forças, desfrutando o mérito da vitória sobre nós mesmos.

Lembremo-nos, finalmente, de que cada um de nós, encarnados, também pode e deve amparar o próximo, de acordo com a nossa capacidade e independente de nosso estágio evolutivo.

Assim procedendo, estaremos, por nossa vez, atuando como auxiliares dos guias espirituais, para o cumprimento dos desígnios divinos, na infinita escala que dá acesso aos cumes evolutivos.

 

(1) KARDEC, Allan. O livro dos espíritos.

Trad. Evandro Noleto Bezerra. Ed. Comemorativa do Sesquicentenário. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Q. 489-521.

(2) Idem. A gênese. 52. ed. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Cap. 1, item 30.

(3)Idem. O céu e o inferno. 60. ed. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2008. P. 1, cap. 8.

(4)Idem. Obras póstumas. 40. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2207. P. 2, A minha primeira iniciação no Espiritismo, item Meu Guia espiritual, p. 304.

(5)FRANCO, Divaldo Pereira. Momentos enriquecedores. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. Salvador, BA: LEAL, 1994.

(6)KARDEC, Allan. O livro dos espíritos.

Trad. Evandro Noleto Bezerra. Ed. Comemorativa do Sesquicentenário. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Q. 500.

(7)Entenda-se “familiares” num sentido mais amplo e não apenas no sentido da parentela corporal.

(8)XAVIER, Francisco C. E a vida continua... Pelo Espírito André Luiz. Ed. Especial. 1. Reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2008.Cap. 25.

(9)Idem. Nos domínios da mediunidade. Pelo Espírito André Luiz. 34. ed. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Cap. 15.

(10)Idem. Missionários da luz. 43. ed. Pelo Espírito André Luiz. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 12.

(11)KARDEC, Allan. O livro dos médiuns. 80. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. P. 1, cap. 1, item 2, p. 22.

 

CHRISTIANO TORCHI

Reformador Jun/09

tags:
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 00:56
Quinta-feira , 02 de Setembro DE 2010

FALSAS ALEGRIAS

 

Encarados Sob o Prisma do Espiritualismo, são os mais ilusórios os conceitos do homem sobre as coisas boas e más, apetecíveis e indesejáveis, tristes e alegres. Sob a luz do Espiritismo, então, esses conceitos se tornam mais que ilusórios, pois que se mostram em toda a nudez de sua falsidade.

Para o Homem Indiferente as Coisas espirituais, em cujo cérebro não passa nem de leve o significado da expressão «vencer o mundo», já que não tem outro interesse senão o de conquistar o mundo, cogitar de uma vida além da morte, ter que pensar em disciplinar a conduta segundo os ditames do Evangelho, ou conformar-se ante as aparentes injustiças que o circundam, é um verdadeiro «atraso de vida»...Não é por outra razão que o consenso predominante é o de «gozar a vida», extraindo dela o melhor quinhão de delícias e regalias, e isso o mais intensamente possível, mesmo porque, diz a «vox populi», a vida é curta...

Isso Explica o Frenesi em que se vive neste mundo sublunar, frenesi que se mostra sobre exaltado nestes últimos tempos, em que a busca do prazer leva as criatura, sob os mais estapafúrdios pretextos, a inventar maneiras inimagináveis de preencher as chamadas «horas de lazer» e a arquitetar tipos de diversão onde se dá vazão ao que o homem tem de mais baixo e instintivo, já que as diversões que realmente merecem esse nome perderam todo o sabor, passaram à categoria de «coisa quadradas». A correria vai num ritmo tal que dá para desconfiar de que os homens se estão apercebendo, inconsciente ou subconscientemente, de que o mundo marcha para o seu fim...

De Outro Angulo, a Questão se Mostra até paradoxal. Como resultado das grandes concentrações urbanas, estão desaparecendo aqueles divertimentos simples que realmente se destinavam a refazer o corpo e a alma das criaturas, e os poucos que subsistem exigem tais canseiras para serem desfrutados que já estão perdendo, realmente, suas características de diversão. Os novos meios de distração colocados ao dispor das grandes massas, os quais, em vez de exigirem o desconforto de sair de casa, entram pela casa adentro, como o rádio e a televisão, servem antes para trazer o desassossego e a apreensão aos espíritos, tais a quantidade e a qualidade das notícias e das imagens que veiculam, por disseminarem de preferência os lados nefastos e deseducativos do que acontece e se faz pelo mundo.

As Grandes Festanças de Carater popular, muitas vezes transformadas em objeto de folclore, se é que algum dia foram diversões, acabam, ou por sua origem, ou por efeito de distorção, constituindo-se, realmente, em mais um incentivo ao que os homens possuem de mais grosseiro e primitivo. Num mundo em que a licenciosidade já era uma chaga a erradicar, e que agora chega a tresvariar com os excessos da permissividade, parece improvável que se consiga implantar um clima favorável às alegrias sadias e espiritualizantes, já que a franca preferência, com bastantes argumentos a favor, é pela satisfação dos impulsos e apetites onde a carne grita, domina e enxovalha.

Não Resta Dúvida de que, Com essa mentalidade, o homem, por muito tempo ainda, continuará a julgar que o Evangelho, a ser observado, venha a constituir-se num «atraso de vida»; continuará a trocar, por considerá-las funéreas e amargas, as alegrias puras e imarcescíveis do espírito pelo aturdimento enganoso das falsas e torpes alegrias do mundo; e a muito custo é que se certificará de que, sem o Evangelho, continuará mergulhado no verdadeiro «atraso de vida»...

Reformador – Fevereiro de 1975

 

tags:
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 00:22
Sábado , 28 de Agosto DE 2010

TEMPERAMENTOS

 

Christian Friedrich Samuel Hahnemann, nascido em 10 de abril de 1755, na Saxônia, um Estado alemão, foi o genial idealizador da Homeopatia, hoje reconhecida como especialidade médica em inúmeros países, inclusive no Brasil.

Suas fórmulas dinamizadas atuam no perispírito, onde se origina a maior parte dos males humanos, conforme nos ensina a Doutrina Espírita.

Hahnemann desencarnou em 2 de julho de 1843, aos 88 anos, após uma existência profícua, inteiramente devotada ao bem da Humanidade.

Tão notável foi esse missionário da Medicina, que conquistou a honra de participar da Codificação da Doutrina Espírita, a partir das primeiras experiências de Kardec, em 1855, portanto apenas 12 anos após seu retorno à Espiritualidade.

Em 1863, Hahnemann transmitiu, em Paris, breve e importante mensagem, inserida no capítulo IX, item 10, de O Evangelho segundo o Espiritismo (Ed. FEB), que transcrevo para apreciação do leitor:

Segundo a ideia falsíssima de que lhe não é possível reformar a sua própria natureza, o homem se julga dispensado de empregar esforços para se corrigir dos defeitos em que de boa vontade se compraz, ou que exigiriam muita perseverança para serem extirpados. É assim, por exemplo, que o indivíduo, propenso a encolerizar-se, quase sempre se desculpa com o seu temperamento. Em vez de se confessar culpado, lança a culpa ao seu organismo, acusando a Deus, dessa forma, de suas próprias faltas. É ainda uma consequência do orgulho que se encontra de permeio a todas as suas imperfeições.

Indubitavelmente, temperamentos há que se presta mais que outros a atos violentos, como há músculos mais flexíveis que se prestam melhor aos atos de força. Não acrediteis, porém, que aí resida a causa primordial da cólera e persuadi-vos de que um Espírito pacífico, ainda que num corpo bilioso, será sempre pacífico, e que um Espírito violento, mesmo num corpo linfático, não será brando; somente a violência tomará outro caráter.

Não dispondo de um organismo próprio a lhe secundar a violência, a cólera tornar-se-á concentrada, enquanto no outro caso será expansiva.

O corpo não dá cólera àquele que não a tem, do mesmo modo que não dá os outros vícios. Todas as virtudes e todos os vícios são inerentes ao Espírito. A não ser assim, onde estariam o mérito e a responsabilidade?

O homem deformado não pode tornar--se direito, porque o Espírito nisso não pode atuar; mas, pode modificar o que é do Espírito, quando o quer com vontade firme. Não vos mostra a experiência, a vós espíritas, até onde é capaz de ir o poder da vontade, pelas transformações verdadeiramente miraculosas que se operam sob as vossas vistas? Compenetrai-vos, pois, de que o homem não se conserva vicioso, senão porque quer permanecer vicioso; de que aquele que queira corrigir-se sempre o pode.

De outro modo, não existiria para o homem a lei do progresso.

Hahnemann aborda uma questão vital: o temperamento, o conjunto dos traços psicológicos e morais que determinam a índole do indivíduo, o seu modo de ser.

Por não aceitar a existência do Espírito – o ser pensante, que sobrevive à morte do corpo – as ciências médicas e psicológicas tendem a situar o temperamento como fruto de condições orgânicas.

A agressividade, a depressão, o suicídio, os transtornos mentais, os vícios, estariam relacionados com disposições neurocerebrais, como uma programação biológica a influir nas iniciativas individuais.

Até os deslizes extraconjugais entrariam nesse rol de calamidades atribuídas à Biologia. Segundo alguns cientistas, visando à perpetuação da espécie, nossos genes controlariam nossas ações, induzindo-nos ao adultério, visto que, quanto maior a promiscuidade, maior a possibilidade de gerar prole numerosa.

Imagine, leitor amigo, a defesa para o adúltero processado pela mulher que deseja o divórcio:

– Senhor juiz, não tenho culpa!

São os genes que me atormentam!

Induzem-me a prevaricar!

No fundo tudo estaria relacionado com a genética, explicando até comportamentos antissociais, como roubo, assalto, assassinato, suicídio...

Diante do delegado:

– Ah! Doutor, eu não queria ser assaltante, mas é incontrolável, está na minha natureza. Das profundezas de meu cérebro os neurônios repetem: Roubar! Roubar!

Roubar!

Algo semelhante ocorre com o comportamento vicioso.

Pretendem alguns cientistas que o bebum tem na estrutura cerebral determinada área ativada, a estimular a tendência para o vício.

Reclama o alcoólatra:

– Meu cérebro é uma esponja etílica! Se não o encharco de água que passarinho não bebe, não me dá sossego!

Hahnemann adverte que tais raciocínios são equivocados.

O temperamento é um atributo do Espírito.

E ainda que haja no corpo determinado arranjo genético que possa exercer certa influência, essa condição orgânica é efeito, não causa.

O corpo não determina; apenas exprime.

É o espelho do Espírito.

O mesmo acontece com relação às doenças que, geralmente, refletem problemas espirituais.

No Espírito estão as causas mais frequentes de nossos desajustes físicos e psíquicos.

A depressão, por exemplo, pode ter um componente genético, mas a origem do mal está no Espírito que, ao reencarnar, imprime na estrutura física algo de sua maneira de ser, resultante das experiências do pretérito, combinando no automatismo reencarnatório elementos hereditários compatíveis.

Devemos, sim, tratar dos efeitos no corpo, buscando a Medicina da Terra.

Mas é preciso, sobretudo, tratar das causas no Espírito, buscando a Medicina do Céu. Esta relaciona-se com a atividade religiosa, a partir de conceitos de ordem moral que trabalham em favor de nossa renovação.

Nesse particular, o Evangelho é o grande compêndio médico da Alma, com prescrições perfeitas para mudar nossa maneira de agir, nosso temperamento, nossas tendências.

Por falar nisso, leitor amigo, diante de problemas envolvendo ânimo exaltado e agressivo, desavenças e ressentimentos, doenças e limitações, pessimismo e desânimo, e tudo o mais que nos cause transtornos, você tem consultado o Evangelho?

Talvez não haja nada disso com você.

Se assim for, parabéns! Certamente houve engano das potestades celestes ao localizá-lo neste vale de lágrimas.

RICHARD SIMONETTI

Reformador set2009

tags:
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 01:38
Sábado , 21 de Agosto DE 2010

O ORGULHO E A HUMILDADE

Que a paz do senhor esteja convosco, meus queridos amigos! Venho até vós para encorajar-vos a seguir o bom caminho.

 

Aos pobres de Espíritos que outrora viveram na Terra, Deus concede a missão de vir esclarecer-vos. Bendito seja pela graça que nos dá, de podermos ajudar o vosso adiantamento. Que o Espírito Santo me ilumine, me ajude a tornar compreensível a minha palavra, e me conceda a graça de pô-la ao alcance de todos. Todos vós, encarnados, que estais sob a pena e procurais a luz, que à vontade de Deus venha em minha ajuda, para fazê-la brilhar aos vossos olhos!

 

A humildade é uma virtude bem esquecida, entre vós. Os grandes exemplos que vos foram dados são tão poucos seguidos. E, no entanto, sem humildade, podeis ser caridosos para o vosso próximo? Oh!, não, porque esse sentimento nivela os homens, mostra-lhes que são irmãos, que devem ajudar-se mutuamente, e os encaminha ao bem. Sem a humildade, enfeitai-vos de virtudes que não possuis, como se vestísseis um hábito para ocultar as deformidades do corpo. Lembrai-vos daquele que nos salva; lembrai-vos da sua humildade, que o fez tão grande e o elevou acima de todos os profetas.

 

O orgulho é o terrível adversário da humildade. Se o Cristo prometeu o Reino dos Céus aos mais pobres, foi porque os grandes da Terra imaginavam que os títulos e as riquezas eram a recompensa de seus méritos, e que a sua essência era mais pura que a do pobre. Acreditavam que essas coisas lhes eram devidas, e por isso, quando Deus as retira, acusam-no de injustiça. Oh, irrisão e cegueira! Deus, acaso, estabeleceu entre vós alguma distinção pelos corpos? O invólucro do pobre não é o mesmo do rico? O Criador fez duas espécies de homens? Tudo quanto Deus fez é grande e sábio. Não lhe atribuais as idéias concebidas por vossos cérebros orgulhosos.

 

Oh!, rico! Enquanto dormes em teus aposentos suntuosos, ao abrigo do frio, não sabes quantos milhares de irmãos, iguais a ti, jazem na miséria? O desgraçado faminto não é teu igual? Bem sei que o teu orgulho se revolta com estas palavras. Concordarás em lhe dar uma esmola; nunca, porém, em lhe apertar fraternalmente a mão. Que! exclamarás: Eu, nascido de sangue nobre, um dos grandes da Terra, ser igual a esse miserável estropiado? Vã utopia de pretensos filósofos! Se fôssemos iguais, porque Deus o teria colocado tão baixo e a mim tão alto? É verdade que vossas roupas não são nada iguais, mas, se vos despirdes a ambos, qual a diferença que então haverá entre vós? A nobreza do sangue, dirás. Mas a química não encontrou diferenças entre o sangue do nobre e do plebeu, entre o do senhor e o do escravo. Quem te diz que também não foste miserável como ele? Que não pediste esmolas? Que não a pedirás um dia a esse mesmo que hoje desprezas? As riquezas são por acaso eternas? Não acabam com o corpo, invólucro perecível do Espírito? Oh, debruça-te humildemente sobre ti mesmo! Lança enfim os olhos sobre a realidade das coisas desse mundo, sobre o que constitui a grandeza e a humilhação no outro; pensa que a morte não te poupará mais do que aos outros; que os teus títulos não te preservarão dela; que te pode ferir amanhã, hoje, dentro de uma hora; e se ainda te sepultas no teu orgulho, oh! Então, eu te lamento, porque serás digno de piedade!

 

Orgulhosos! Que fostes, antes de serdes nobres e poderosos? Talvez mais humildes que o último de vossos servos. Curvai, portanto, vossas frontes altivas, que Deus as pode rebaixar, no momento mesmo em que as elevais mais alto. Todos os homens são iguais na balança divina; somente as virtudes os distinguem aos olhos de Deus. Todos os Espíritos são da mesma essência, e todos os corpos foram feitos da mesma massa. Vossos títulos e vossos nomes em nada a modificam; ficam no túmulo; não são eles que dão a felicidade prometida aos eleitos; a caridade e a humildade são os seus títulos de nobreza.

 

Pobre criatura! És mãe, e teus filhos sofrem. Estão com frio. Têm fome. Vais, curvada ao peso da tua cruz, humilhar-te para conseguir um pedaço de pão. Oh, eu me inclino diante de ti! Como és nobre, santa e grande aos meus olhos! Espera e ora: a felicidade ainda não é deste mundo. Aos pobres oprimidos, que nele confiam, Deus concede o Reino dos Céus.

 

E tu, que és moça, pobre filha devotada ao trabalho, entregue às privações, por que esses tristes pensamentos? Por que chorar? Que teus olhos se voltem, piedosos e serenos, para Deus: às aves do céu ele dá o alimento. Confia nele, que não te abandonará. O ruído das festas, dos prazeres mundanos, te faz bater o coração. Querias também enfeitar de flores a fronte e misturar-te aos felizes da Terra, dizes que poderias, como as mulheres que vês passar, estouvadas e alegres, ser rica também. Oh, cala-te, filha! Se soubesses quantas lágrimas e dores sem conta se ocultam sob esses vestidos bordados, quantos suspiros se asfixiam sob o ruído dessa orquestra feliz, preferirias teu humilde retiro e tua pobreza. Conserva-te pura aos olhos de Deus, se não queres que o teu anjo da guarda volte para Ele, escondendo o rosto sob as asas brancas, e te deixe com os teus remorsos, sem guia, sem apoio, neste mundo em que estarias perdida, esperando a punição no outro. E todos vós que sofreis as injustiças dos homens, sede indulgentes para as faltas dos vossos irmãos, lembrando que vós mesmos não estais sem manchas: isso é caridade, mas é também humildade. Se suportais calúnias, curvai a fronte diante da prova. Que vos importam as calúnias do mundo? Se vossa conduta é pura, Deus não pode vos recompensar? Suportar corajosamente as humilhações dos homens, é ser humilde e reconhecer que só Deus é grande e todo-poderoso.

 

Oh!, meu Deus, será preciso que o Cristo volte novamente a Terra, para ensinar aos homens as tuas leis, que eles esquecem? Deverá ele ainda expulsar os vendilhões do templo, que maculam tua casa, esse recinto de orações? E, quem sabe?, oh, homens, se Deus vos concedesse essa graça, se não o renegaríeis de novo, como outrora? Se não o acusaríeis de blasfemo, por vir abater o orgulho dos fariseus modernos? Talvez, mesmo, se não o faríeis seguir de novo o caminho do Gólgota?

 

Quando Moisés subiu ao Monte Sinai, para receber os mandamentos da Lei de Deus, o povo de Israel, entregue a si mesmo, abandonou o verdadeiro Deus. Homens e mulheres entregaram seu ouro, para a fabricação de um ídolo que abandonaram. Homens civilizados fazeis, entretanto, como eles. O Cristo vos deixou a sua doutrina, vos deu o exemplo de todas as virtudes, mas abandonastes exemplos e preceitos. Cada um de vós, carregando as suas paixões, fabricou um deus de acordo com a sua vontade: para uns terrível e sanguinário; para outros, indiferente aos interesses do mundo. O deus que fizestes é ainda o bezerro de ouro, que cada qual apropria aos seus gostos e às suas idéias.

 

Despertai, meus irmãos, meus amigos! Que a voz dos Espíritos vos toque o coração. Sede generosos e caridosos, sem ostentação. Quer dizer: fazei o bem com humildade. Que cada um vá demolindo aos poucos os altares elevados ao orgulho. Numa palavra: sede verdadeiros cristãos, e atingireis o reino da verdade. Não duvideis mais da bondade de Deus, agora que Ele vos envia tantas provas. Viemos preparar o caminho para o cumprimento das profecias. Quando o Senhor vos der uma manifestação mais esplendente da sua clemência, que o enviado celeste vos encontre reunidos numa grande família; que os vossos corações, brandos e humildes, sejam dignos de receber a palavra divina que Ele vos trará; que o eleito não encontre em seu caminho senão as palmas dispostas pelo vosso retorno ao bem, à caridade, à fraternidade; e então o vosso mundo se tornará um paraíso terreno. Mas se permanecerdes insensíveis à voz dos Espíritos, enviados para purificar e renovar as vossas sociedades civilizadas, ricas em conhecimentos e não obstante tão pobre de bons sentimentos, ah! nada mais nos restarás do que chorar e gemer pela vossa sorte. Mas, não, assim não acontecerá. Voltai-vos para Deus, vosso pai, e então nós todos, que trabalhamos para o cumprimento da sua vontade, entoaremos o cântico de agradecimento ao Senhor, por sua inesgotável bondade, e para o glorificar por todos os séculos. Assim seja.

 

*

ADOLFO

Bispo de Alger, Marmande, 1862

 

tags:
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 04:45
Terça-feira , 06 de Julho DE 2010

O ESPIRITISMO DEMONSTRA A VERDADE DE ALGUMAS HERESIAS

WASHINGTON LUIZ N. FERNANDES

 

 

Muito interessante lembrarmos algumas opiniões, classificadas na historiografia humana como heresias religiosas (lat. haeresis e gr. hairesis – escolha, propensão), desde os primeiros séculos do Cristianismo.

Por heresias religiosas devemos entender as idéias que estiveram contrárias à fé estabelecida como oficial, tidas como falseadoras de Revelações Divinas. E os defensores destas afirmações, por contrariarem os dogmas estabelecidos pelas religiões dominantes, foram por isso considerados demoníacos, e muitos pagaram com a própria vida o crime de dizerem suas opiniões.

Ocuparnos-emos só dessas heresias doutrinário-religiosas, não nos detendo nas que tratavam das Leis Naturais como, por exemplo, as do físico e astrônomo italiano Galileu Galilei (1564-1642), que afirmava que a Terra é que girava e não o Sol, e por dizer esta verdade científica quase morreu queimado.

Constrange-nos um pouco escrever sobre isso, apresentando lamentáveis registros históricos, mas o fazemos por dever de fidelidade à verdade dos fatos, pois acreditamos que este estudo oferece valioso material de pesquisa e reflexões.

É possível que esse tipo de atentado à liberdade de pensamento ainda ocorra em nossos dias, mais no plano moral do que material, sob a justificativa da defesa da verdade, mas por certo traduz da mesma forma a intolerância e o personalismo.

Será de cansar ver tantos “ismos” (sufixo que indica doutrina filosófica ou religiosa) juntos, mas necessário apelar para a paciência dos leitores.

Houve heresias que realmente estavam equivocadas, podendo-se citar o Adocionismo (séc. II), que professava que Jesus não era Filho de Deus desde a eternidade, mas só a partir do batismo; o Marcionismo, doutrina dualista do gnóstico Marcião (85-160) que distinguia entre Deus-Pai e um criador ou demiurgo, sendo Jesus-Cristo o enviado do primeiro para livrar a Humanidade do segundo rejeitando o Antigo e o Novo Testamentos, com exceção do Evangelho de Lucas e de algumas epístolas de Paulo. Seus seguidores tornaram-se maniqueus, da doutrina Maniqueísta, fundada por Manes (216-274), baseada na existência de dois princípios opostos, o Bem e o Mal. Vale lembrar que Santo Agostinho (354-430), quando jovem, foi maniqueu por nove anos; o Catarismo, seita dos Cátaros, iniciada no séc. XI, que da mesma forma acreditava no dualismo do Bem e do Mal; o Montanismo, doutrina religiosa do séc. II, também conhecida como heresia frígia, fundada por Montano (séc. II), que se dizia combatidas. Elas se opunham a orientações dogmáticas criadas pelos próprios homens e, em verdade, estes dogmas é que mereciam a condição de falsear o que é certo.

Rechaçadas com impiedade e intolerância, pelos que detinham o poder, e se arrogavam a condição de donos da verdade, foram aplicadas a seus defensores penalidades civis, excomunhão, cruéis penas e até a morte. A Inquisição foi criada, no séc. XII, objetivando combater as heresias, especialmente o Catarismo.

Aquele que tivesse ciência de algum comportamento mencionado em edital inquisitorial, e não o viesse revelar, seria perseguido como fautor de hereges, isto é, pelo crime de acobertar culpas de hereges. Depois de preso, o réu era submetido a longos interrogatórios, não lhe sendo comunicado o motivo de sua prisão, nem o crime de que era acusado, ou qual o seu denunciante.

Em enciclopédias brasileiras e internacionais, encontramos as questões heréticas tratadas ao sabor das crenças dos colaboradores destas obras, por vezes claramente partidários das religiões dogmáticas dominantes, e por isso concordando em alguns casos com estas idéias.

Logo no início do Cristianismo, admiramos o conteúdo de algumas dessas chamadas heresias, que retrataram em verdade grande lucidez de seus defensores.

Heresias que eram verdadeiras

Somente a título de ilustração, vamos comentar algumas dessas opiniões, comparando com os esclarecimentos trazidos pelo Espiritismo:

– Monarquianismo (ou Modalismo ou Sabelianismo): Foi a negação da trindade das pessoas divinas, considerados o Filho e o Espírito Santo como modos do Pai. O Monarquianismo, rejeitando a separação dessa chamada divina substância, foi criado por Noets (140-200), e teve em Sabélio (séc. II), da Líbia, um dos principais divulgadores, tendo sido este excomungado em Roma, pelo Papa S. Calisto I.

– Arianismo: Negava a divindade de Jesus. Considerada uma das primeiras grandes heresias cristãs, tendo em Ário (c. 250-336 d.C.) seu iniciador. Segundo ele, Jesus não seria co-eterno e da mesma substância do Pai, mas foi criado por Ele. Ele tem um começo, mas Deus não. Esta doutrina foi rejeitada pelo Concílio de Nicéia (325), e condenada pelo Concílio de Constantinopla (381). Propagou-se principalmente entre os povos germânicos (ostrogodos, visigodos, burgúndios). Segundo Ário, nos primeiros textos dos quatro Evangelistas, o Filho aparece subordinado ao Pai, o que destrói a igualdade da Santíssima Trindade. Portanto, Jesus não seria de modo algum Deus.

– Socinianos: Uma forma de arianismo, do séc. XVI. Este nome deveu-se a Lello Socin (1509-1562), tido como heresiarca, que negava a divindade de Jesus, a existência do Espírito Santo e a utilidade dos Sacramentos.

– Nestorianismo: No tocante a uma de suas afirmações, sobre Maria de Nazareth, o Nestorianismo, fundado por Nestório (380-451), patriarca de Constantinopla, afirmava ser ela somente a mãe de Jesus e não mãe de Deus. O Nestorianismo foi condenado pelo Concílio de Éfeso, em 431.

– Espiritismo: Admite a existência de um Deus único, inteligência suprema do Universo, Causa Primária de todas as coisas. Jesus, como Ele mesmo o disse, mais de quarenta vezes em o Evangelho, era o Filho de Deus, como todos nós o somos, porém, Ele era mais evoluído, e veio nos ensinar o Evangelho. Maria, e também José, foram os pais de Jesus e, diretamente inspirado pelo Espírito Santo, e pregava uma próxima vinda corporal de Jesus; o Docetismo (de Valentin, séc. II) e o Apolinarismo (de Apolinário, séc. IV), segundo os quais Jesus teve um corpo aparente, negando a realidade de sua crucificação e sua alma humana; o Priscilianismo, doutrina do cristão espanhol Prisciliano (335-385), que apesar de ser antitrinitário (contra a Santíssima Trindade), defendeu o Gnosticismo e o Maniqueísmo, sendo um dos primeiros a ser executado por defender suas idéias.

Mas há outras idéias, que veremos a seguir, as quais estavam totalmente certas, conforme demonstrado pelo Espiritismo, e da mesma forma foram por isso, ela não é mãe de Deus, que é o Criador de todas as coisas, mas a genitora de Jesus. Além do que, se Maria fosse mãe de Deus, Ele não seria mais o Criador de tudo, tendo sido Ele por ela criado.

O Espírito Santo pode ser entendido como uma plêiade de Espíritos Superiores, que colaboram para o progresso do mundo.

A Santíssima Trindade, que identifica Pai, Filho e Espírito Santo numa só unidade, definindo um no outro, nada mais é do que um dogma de origem totalmente material, criado pelos homens e não por Jesus, que não trouxe nenhuma orientação dogmática para o comportamento.

– Waldenses: Foi um movimento iniciado pelo religioso francês Peter Waldo (ou Valdo), no séc. XII, que defendia a pobreza e a simplicidade, em oposição à idéia de religião associada ao luxo que existia em seu tempo, isto um pouco antes da odisséia franciscana em Assis. Waldo pronunciou sua Profissão de Fé, e foi perseguido e condenado pela cúpula religiosa. Waldo combateu também a adoração ao crucifixo, a idéia de as igrejas considerarem-se sagradas, os sacramentos e o purgatório. Vale lembrar que os sacramentos são atos rituais que visam a santificar as pessoas envolvidas, e seus defensores afirmam que eles foram instituídos por Jesus, o que não é verdade, pois Ele não trouxe nenhum ritual.

– Pelagianismo: Seita tida como herética, iniciada pelo monge e teólogo britânico Pelágio (360-425), negou a necessidade da graça, realçando as forças do livre-arbítrio; é por este modo que cada um vai para o céu, a depender de seus esforços. Negou totalmente que a salvação fosse uma graça. O Pelagianismo foi condenado pelo Concílio de Éfeso (431).

– Albigenses: Seita iniciada em França, no séc. XII, com uma rude oposição ao clero, contra o pagamento dos dízimos, condenava os religiosos que estivessem voltados mais às coisas materiais, pregava contra os sacramentos, combatiam o batismo das crianças, julgavam desnecessários os altares e imagens de santos, com destaque para Pedro de Bruys. O Concílio de Albi (1176) condenou esta seita.

– Donatismo: Crença de Donato (270-355), bispo da Numídia, que não atribuía nenhum valor aos sacramentos, tendo em vista a indignidade dos sacerdotes e bispos.

...

O Espiritismo demonstra a total verdade destes pensamentos. Inicialmente, relembra a mensagem do Cristo, no seu mais puro entendimento. No Prefácio de O Evangelho segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, assinado por O Espírito de Verdade, no segundo parágrafo consta: Eu vos digo, em verdade, que são chegados os tempos em que todas as coisas hão de ser restabelecidas no seu verdadeiro sentido...

Todas as coisas, que deviam ser restabelecidas no seu verdadeiro sentido, devemos entender, sem dúvida, que são o Evangelho na sua mais simples moral, deixando de lado os aspectos cerimonial e ritualístico, que foram introduzidos pelos homens e não criados por Jesus. A missão de Jesus foi trazer e vivenciar as lições de amor, humildade, fraternidade, perdão e retribuir o mal com o Bem, e nunca trazer religião associada a sinais exteriores. Ele veio ensinar moral, não ritual. Imaginar que nos tornaríamos cristãos, através de uma cerimônia chamada Batismo, é desconhecer por completo o Evangelho.

A Doutrina Espírita explica que isto absolutamente não procede, ensinando que nos tornaremos cristãos somente se praticarmos a moral ensinada e repetida por Jesus, e não participando de qualquer cerimônia. Ele mesmo o diz (João, 14:15): Se me amais, guardai meus mandamentos...

Por isso também Ele, em outra ocasião, enfatizando o nosso livre-arbítrio, fala que, buscando, acharemos e, batendo, se nos será aberto (Mateus, 7:7 e seguintes), significando assim que temos um compromisso na ação e no trabalho, pois a fé sem obras é morta. (Tiago, 2:20.)

Como é comum acontecer, passados os anos e séculos, muitas dessas doutrinas tidas como heréticas incorporaram outros pontos doutrinários, que acabaram alterando as idéias iniciais, mas fica registrado o início destas lúcidas opiniões.

O Espiritismo, portanto, ratifica estas idéias primeiras, consideradas heréticas, e demonstra que elas traduziram a mais pura e simples verdade e, por isso, homenageamos estes grandes homens que souberam identificar nos primórdios do Cristianismo estes grandes erros religiosos, e quando nos referirmos a eles, que não sejam mais chamados de hereges ou heresiarcas, mas sim lúcidos pensadores...

Algumas das penas para os que defenderam suas opiniões, sendo considerados hereges:

– Em 285, foram mortos vários Priscillianos, por motivos de heresia, por

ordem dos bispos;

– em 782, a rogo do Papa Estevam III, Carlos Magno descabeçou, num dia, cinco mil saxões em Verden, por recusarem o batismo. Pouco depois mandou queimar muitas pessoas que preferiam o canto ambrosiano ao gregoriano;

– em 1007, foram queimados vivos, em Orleans, muitos heréticos;

– em 1134, Peter de Brucys foi queimado vivo no Languedoc por ter negado o batismo das crianças e a transubstanciação;

– em 1155, Arnaldo de Brescia foi enforcado por ter professado a doutrina de que o clero não deve viver senão de dons voluntários;

– em 1160, os Valdenses, reformadores, muitos foram queimados vivos; cerca de três mil morreram em França, entre eles crianças de pouca idade;

– em 1209, os Albigenses, outros reformadores, que aderiram a uma forma de cristianismo menos corrupto, foram trucidados por heresia em Beziera;

– os judeus, nos reinados de Ricardo I, João e Henrique III, foram trucidados, torturados e, em 1290, foram expulsos da Inglaterra, tendo seus bens confiscados;

– em 1222, um sínodo fez queimar um herético em Oxford;

– em 1300, Sagarelli, fundador de uma seita análoga à dos modernos Shakers, foi queimado em Parma;

–         em 1302, incineraram a monarquia de Dante. Ele mesmo, condenado à fogueira, fugiu e foi excomungado depois de sua morte.

–         (Somente alguns dos inúmeros fatos citados na obra de Susana Gay, da vida de Fletcher, e retirados do jornal O Mundo Oculto, Campinas (SP), nov./1907, p. 4.) l

 

tags:
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 04:58

mais sobre mim

pesquisar

 

Novembro 2011

D
S
T
Q
Q
S
S
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30

posts recentes

últ. comentários

arquivos

tags

subscrever feeds

blogs SAPO


Universidade de Aveiro